quinta-feira, 30 de abril de 2015

Transgressividade #6: Salò, ou os 120 Dias de Sodoma (1975)

Capa de Salò, ou os 120 Dias de Sodoma
"Um dos filmes mais notórios, poderosos e desafiadores da história!"
- DVD TIMES

"Um dos 100 melhores filmes do século XX"
- VILLAGE VOICE, PESQUISA DE CRÍTICOS DE CINEMA

"Um dos 100 filmes mais assustadores da história"
- CHICAGO FILM CRITICS ASSOCIATION

"A despedida impressionante e terrível de Pasolini"
- VILLAGE VOICE

Considerado um filme depravado, degradante, desumano, chocante, repulsivo e demais adjetivos desse gênero: esse é o último filme do renomado cineasta italiano Pier Paolo Pasolini.

Salò é uma adaptação livre e inconteste do romance 120 Dias de Sodoma do autor libertino e aristocrata francês Marquês de Sade. O enredo se passa na Itália - até então comandada por Benito Mussolini - no ano de 1944. Quatro dirigentes fascistas selecionam 16 jovens para satisfazer seus prazeres, obrigando-os a acatar qualquer ordem que lhes for dada.

Embora muitos possam não perceber isso - devido as cenas escatológicas e bizarras contidas no filme - com Salò, Pasolini faz uma crítica velada ao regime nazi-fascista que imperou na Itália na década de 40. A própria figura dos quatro dirigentes fascistas (um banqueiro, representando o poder econômico; um bispo, representando a Igreja; um duque, representando a nobreza; e um juiz, representando a ordem) são pontos em que Pasolini procurou evidenciar a putrefação de setores de uma sociedade em decadência em função do governo.

Após apresentar aos 16 jovens as regras que estes deveriam obedecer, a atmosfera bestial e inescrupulosa começa a tomar forma. No primeiro segmento do filme (que contém três segmentos) denominado Círculo das Obsessões, uma mulher assume a função de contar histórias eróticas para instigar a imaginação dos dirigentes que - quando se sente com vontade - escolhe um dos jovens e o leva para um aposento onde lhe é saciado os seus desejos.

No segundo segmento do filme, denominado Círculo da Merda, as histórias contadas (dessa vez por outra mulher) tem uma característica em especial: fezes. Tudo nesse segmento funciona em função de excremento. Cenas bizarras (e degradantes) são vistas, desde a competição para saber quem tem o ânus mais bonito até o grande banquete de merda que é servido para todos.

Cena onde os quatro homens conferem cautelosamente o ânus mais bonito,
cobrindo a cabeça dos jovens para que seu julgamento não seja influenciado.
No terceiro e último segmento, denominado Círculo do Sangue, os quatro homens punem àqueles que descumpriram as regras impostas no início. Em uma sucessão de cenas de tortura que vão desde usar fogo para queimar o pênis de um rapaz até usar marcadores de boi nos mamilos de uma moça, Pasolini confirma o que se viu durante toda a película: a degradação humana.

Salò, porém, vai além das cenas impactantes e perturbadoras. Com um roteiro fascinante, o diretor italiano consegue transmitir ao espectador uma repulsa imensa que beira ao inconcebível. A angústia de ver diálogos crus e viscerais é inquietante. A cada cena o espectador nutre e alimenta um asco que demora a ir embora.

Salò é talvez uma das obras mais impactantes da história. Faz jus a figura excêntrica que Pasolini construiu no decorrer de sua existência e de sua obra, que tinha em suas mais constantes características: a visão negativa do mundo e o abuso de cenas de nu-não-tão-artístico. Esta obra é, em definitivo, a despedida excruciante e inconteste de Pasolini.

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Curiosidades:

1. Salò é a primeira parte de uma trilogia que Pasolini pretendia produzir chamada Trilogia da Morte, porém a gravação desta não foi possível devido a morte do diretor poucos dias antes da estréia de Salò.
2. Ennio Morricone, compositor da trilha-sonora de Salò, diz ter se sentido desconfortável ao assistir o filme.
3. Apesar das grotescas cenas do filme, a atriz Hélène Surgère afirmou em entrevista que as gravações no set eram alegres e descontraídas.
4. O elenco não tinha muita noção de como o filme ficaria até que estivesse pronto devido ao exaustivo trabalho de edição que foi feito em cima de Salò.

segunda-feira, 13 de abril de 2015

Dedo de Prosa #1: Velozes e Furiosos 7

Capa de Velozes e Furiosos 7
A franquia de Dominic Toretto chega a sua sétima sequência, e mais uma vez, as cenas de ação são de arrepiar. Contando com a participação de Jason Statham, Kurt Russell, Djimon Hounsou, Nathalie Emmanuel e uma rápida aparição da rapper australiana Iggy Azalea, a turma de Toretto parte para mais uma de suas aventuras.

Apesar de ser o fulcro central do enredo, a vingança de Ian Shaw não é - em absoluto - o aspecto que dita a história em si. Muitos aspectos de importância compõem o enredo.

O dilema de Brian, tendo que viver uma vida pacata para dar o suporte necessário a sua mulher e filho e, ao mesmo tempo, conviver com a abstinência da adrenalina, a "saudade das balas". A confusão mental de Letty, que não consegue reviver em sua memória os momentos vividos ao lado de Dom. A própria homenagem realizada pelos atores à Paul Walker também ajuda a compor o enredo. Mas tudo mesclando velocidade e ferocidade.

Contudo, certas características do enredo não mudam. A frequente e cômica sacanagem que Roman e Tej fazem um com o outro, os constantes "sermões" de Dom sobre a importância da família, as cenas de ação cada vez mais absurdas e muito mais.

Porém, um dos trabalhos mais importantes dessa sétima sequência não está na frente das câmeras, ele está na direção. James Wan (Jogos Mortais, Invocação do Mal, Sobrenatural) trouxe um profissionalismo à franquia que ainda não havia se visto nos filmes anteriores. Enquadramentos fantásticos, acréscimo do foco no drama e um roteiro que, embora não seja lá grande coisa, consegue ser mais direto e efetivo do que o dos filmes anteriores.

A trama inicia com Ian Shaw no hospital, deixando seu irmão aos cuidados dos médicos. Logo após isso, ele vai atrás dos responsáveis da surra sofrida pelo irmão. Primeiro, ele pega Hobbs, deixando-o impossibilitado. Depois, ele vai atrás de Toretto e sua trupe. 

Para contra-atacar Shaw, Toretto se une a "Sr. Ninguém" (Kurt Russell), substituo de Hobbs na CIA. Porém, para firmar essa união, "Sr. Ninguém" precisa que Toretto resgate Ramsey (Nathalie Emmanuel), hacker responsável pela criação do "Olho de Deus", dispositivo capaz de encontrar qualquer pessoa em poucos instantes. Esse dispositivo está nas mãos erradas e "Sr. Ninguém" precisa tirá-lo deles.

Daí em diante, o que se vê é uma constante luta entre Ian Shaw x Toretto e cia. x raptores do Olho de Deus. As cenas são insanas, violentas: aquilo que um verdadeiro filme de ação necessita. Mas, apesar de toda atmosfera violenta, o filme tem uma alta carga melodramática, e não podia ser diferente. 

A repentina morte de Paul Walker durante as filmagens foi um dos fatores primordiais para todo o sucesso de Furious 7, que em 12 dias já se tornou o mais rentável da franquia. Os fãs da franquia compareceram em peso, para prestar essa última homenagem.

Durante todo o filme, a morte de Brian parece que está prestes a acontecer em diversas vezes. Fica aquela sensação de "é agora" dos espectadores. Em cada gesto, cada frase, pode-se perceber o momento chegando. Mas até então, ele não morre. Apenas no final do filme, quando Toretto e Brian se encontram na estrada e seguem em caminhos diferentes, é que a seguinte fala é vista, enquanto imagens dos filmes anteriores aparecem: 

"Eu costumava dizer que vivia só o momento e acho que por isso éramos irmãos, porque você também era assim. Não importa onde você esteja, se a um quilômetro de distância, ou do outro lado do mundo, você sempre estará comigo. E sempre será meu irmão".

Pode parecer uma homenagem piegas, mas a conjuntura do filme faz com que Furious 7 se torne um lindo filme-tributo à Paul Walker. E o que se pode concluir sobre o filme é: Velozes e Furiosos 7 passa longe de ser um filme artístico, mas é uma dose fascinante para quem busca entreter-se com boas cenas de ação e para quem deseja prestar uma última homenagem a esse personagem tão importante na franquia.

quinta-feira, 9 de abril de 2015

Trailer: A Centopeia Humana 3 - Sequência Final

Hoje, dia 9 de abril, a IBC Films divulgou (finalmente) o trailer do último filme da trilogia A Centopeia Humana. Para os conhecedores dos filmes anteriores, fica a ansiedade para a estreia, prevista para o dia 22 de maio nos EUA. Para os desconhecedores da franquia, o trailer já é um grande preparo para o que vem pela frente.

Trailer: Centopeia Humana 3 - Sequência Final

A trama conta com o retorno dos protagonistas dos filmes anteriores (Dieter Laser e Laurence R. Harvey), porém em papéis diferentes. Dieter interpreta Bill Doss, diretor de um completo carcerário - cansado dos problemas na penitenciária - que, ao lado de seu comparsa Dwight (interpretado por Harvey), resolve colocar em prática uma experiência vista em um filme. Para isso, ele contrata uma equipe médica para realizar um ato inimaginável: uma centopeia de quinhentas pessoas conectadas.

Para abrilhantar o filme, o elenco ainda conta com Eric Roberts, Robert LaSardo e a (maravilhosa) atriz pornô Bree Olson. E ainda há uma ponta de Tom Six, diretor e roteirista da franquia.

Agora é esperar e nos preparar para a próxima barbárie saída da mente insana do Tom Six.

domingo, 5 de abril de 2015

Transgressividade #5: Vase de Noces (1974)

Capa de Vase de Noces
Dirigido por Thierry Zéno, esse peculiar filme belga trata de um tema pouco abordado no mundo do cinema: a zoofilia. Mas não é apenas isso que o filme tenciona passar. Por trás de toda atmosfera bestial, há uma mensagem escondida.

Contendo uma belíssima trilha-sonora e com ausência de diálogos, Vase de Noces acaba por ser um filme muito interpretativo. O personagem interpretado por Dominique Gamy também não ajuda. Cabe ao telespectador estar atento aos acontecimentos da tela.

No início do filme, o personagem de Dominique Gamy aparece com um pássaro na mão, tentando colocar na cabeça da ave uma cabeça de boneca. Com a tentativa falha, ele liberta o pássaro.

O enredo inteiro gira em torno do relacionamento do homem com a porca. Mas o interessante no filme é a forma como a situação vem se formando. 

No convívio social humano, os relacionamentos são compostos por todo um processo de conhecimento e reciprocidade. Isso também é perceptível na forma como o homem trata a porca. Apesar de em algumas cenas ele aparecer nu por detrás da porca, em nenhum momento ele aplica o ato da penetração. Ele espera, pacientemente, até que a porca esteja preparada para isso. Pode ser uma analogia longínqua, mas não se pode dizer que esta seja errônea.

Cena do coito entre o homem e a porca.
Um misto de romance e prazer.
Até que o momento chega. Em um belo dia, os dois praticam o tão desejado (pelo homem) coito. A cena não é tão chocante quanto se pode imaginar. O carinho com que o homem trata o suíno torna toda a atmosfera presente na cena, de certa forma, até romântica. Após o coito, os descendentes nascem e a prole do curioso casal é formada.

Não julgarei a procedência de tal ato, pois não tenho conhecimento suficiente de medicina veterinária para afirmar se existe realmente a possibilidade de descendência em uma relação entre humanos e suínos. 

Deixo aqui apenas uma observação: em um dos episódios do seriado House, o médico diagnóstico Gregory House usa um suíno para drenar o sangue do seu paciente (e essa prática é realmente factível). Se o tipo sanguíneo de ambas espécies tem tamanha proximidade, não seria, ao menos provável, a fusão dos genes?

Mas... voltando ao filme. A partir do nascimento dos filhotes de híbridos, o homem passa a tentar "educá-los", tenta dar a eles uma natureza mais humana. Isso se torna notório na cena em que o homem coloca os três filhotes em cima da mesa, cada um em frente a uma tigela com leite. Porém, o que ocorre é que os três sempre tentam tomar o leite da mesma tigela (remetendo à mãe, fonte de onde os três conseguem se alimentar).

Sem conseguir obter sucesso nesse processo de educação, o homem enforca os filhotes e os coloca em três potes de vidro. Pouco mais a frente, a mãe se depara com a imagem de seus filhotes mortos e se suicida. Essa cena é bastante tocante, o desespero da mãe porca quando se depara com seus descendentes mortos é agoniante.  O grunhido/ronco dela é aterrador.

Quando a porca morre, o homem decide enterrá-la. Ele abre um buraco no chão e se deita ao lado da porca e começa a arrastar a terra para cobri-los. Porém, passado-se um tempo após estarem cobertos de terra, o homem se ergue e sai dali. Ele corre, nu, em direção a sua casa. Lá, ele vai de encontro aos seus filhotes mortos, como a expressar seu arrependimento.

O homem, aparentemente arrependido de ter matado os filhotes.
Logo após isso, ele pega o recipiente onde fazia suas necessidades fisiológicas e começa a degustá-las. Numa estratégia curiosa, ele ferve as fezes. Até mesmo as molha na sua urina, como se estivesse molhando-as em algum tipo de molho. Logo após essa sucessão de acontecimentos, ele se suicida. Sobe em uma escada e se enforca. E aqui o filme termina.

Vase de Noces é um filme de romance de gosto peculiar. Para os admiradores da cena underground, é uma ótima pedida. Gravado em preto e branco, com apenas um ator e uma mente singular por trás da realização, esse filme deixa marcado o seu nome na cena underground.

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Curiosidades:

1. O conceito do filme foi moldado a partir do quadro Pornocrates, de Félicien Rops. Pintor, litógrafo, gravurista e desenhista belga que abordava temas como sexo, morte e satanismo.
2. Há um acontecimento no filme de pouca relevância no enredo, mas curioso pelo fato de não ter um significado. Diariamente, o homem toca um sino. Mas não fica claro o porquê disso.
3. Vase de Noces é conhecido por vários nomes, inclusive The Pig Fucking Movie, que acabou por se tornar um subtítulo oficial em inglês do filme. Entretanto, o filme também é conhecido por Wedding Through (título oficial em inglês) e One Man and His Pig (título não-oficial).
4. A tradução do título original - Vase de Noces - para o português, significa "Vaso de Casamento", enquanto o título em inglês se traduz como "Através do Casamento".