sábado, 15 de abril de 2017

Dedo de Prosa #14: Velozes e Furiosos 8 (2017)

Capa do filme.
Existem alguns fatos que são visíveis para todos. Talvez o mais evidente deles é o tamanho do significado que a franquia Velozes e Furiosos tem para a história da cinematografia mundial. Repleto de conceitos filmográficos revolucionários, sempre com um roteiro extremamente filosófico e profundo ao investigar a natureza humana, com um zelo técnico absurdo no tratamento dado aos enquadramentos e os jump-cuts sempre muito bem colocados e, especialmente, com um compromisso irrefragável com a coesão com a realidade, sempre retratando situações totalmente factíveis e com nexo.

A atuação dos atores, que aparecem na tela como um conjunto de professores a ensinar para os seus colegas de Hollywood como se atuar, é primorosa. A riqueza do mise-en-scène é tamanha que fariam produções clássicas do cinema da Nouvelle Vague se prostrarem em reverência ao imenso acervo de nuances interpretativas que os gênios da interpretação que fizeram este filme têm.

A produção contínua dos diálogos - extremamente herméticos, dada a complexidade dos assuntos tratados - aliada a uma trilha-sonora minuciosamente escolhida - como uma mistura de tons do classicismo dramático de Wagner com a limpidez romântica de Chopin - e, para encerrar com chave de ouro, uma fotografia que produziria arrepios ao Malick, é algo que marcará para sempre o cinema.. Tudo isso, composto numa narrativa épica com toques de tragédia grega, produz uma sinestesia sem precedentes aos seus telespectadores, comprovando como a franquia se estabelece como um divisor de águas para a produção cinematográfica no mundo.

Mas agora falando sério (e espero, sinceramente, que você tenha percebido o sarcasmo das palavras ditas anteriormente), a fórmula seguida por Vin Diesel e sua trupe já não é segredo de ninguém. As repetições dos mesmos clichês são vomitadas na sua cara sem a menor vergonha. Dessa vez, tentando provocar um twist diferente, os produtores buscaram fazer com que o próprio Dom (Vin Diesel) fosse o agente questionador daquilo que constituiu a franquia (e que é repetido ad aeternum sem o menor pudor): a família.

Colocando caras novas no elenco (como o fraquíssimo Scott Eastwood, a coroa mais linda e talentosa do mundo: Helen Mirren, o - para mim - mal aproveitado Kristofer Hivju e a deslumbrante Charlize Theron) e fazendo com que alianças nada prováveis, como a de Hobbs (Dwayne "The Rock" Johnson) e Ian Shaw (Jason Statham), ocorram, o filme tenta desvirtuar um pouco da logística da narrativa. Pra contribuir, o filme ainda traz à tona figuras carimbadas de longas anteriores, como a policial Elena (Elsa Pataky).

Contudo, nem mesmo a revolta de Dom (Vin Diesel) é capaz de produzir uma mudança significativa na linha de raciocínio dos produtores e roteiristas da franquia. Até mesmo os alívios cômicos oferecidos por Roman (Tyrese Gibson) estão presentes como função narrativa indispensável para a casca do funcionamento do enredo, que já é do conhecimento de todos.

Há tempos que Velozes e Furiosos perdeu aquela essência dos rachas e da cultura de rua dos carros fodelásticos, se transformando em uma franquia de ação compromissada apenas com o entretenimento do público em ver tiros, porrada e bomba (como diria uma pensadora contemporânea (sic) por aí). Mas vou além, pois algo ficou claro com este oitavo filme: para além da ação, a franquia é também uma produção extensa de aventuras, onde um grupo assume a responsabilidade de vencer a "batalha". No quinto filme o inimigo era Hobbs (Dwayne "The Rock" Johnson), no sexto era Owen Shaw (Luke Evans), no sétimo era Ian Shaw (Jason Statham) e neste oitavo temos Charlize Theron (Cipher), mas em todos eles se percebe a criação de toda uma problemática a ser resolvida.

Seja como for, é o que já disse algumas vezes: a opção em assistir mais um filme da franquia é rigorosamente nem um pouco ligada à técnica. Afinal, é justamente o apelo comercial e o imaginário popular que impulsionam o sucesso da franquia. Se você é como eu e aprecia películas em que o contexto narrativo tem função exclusiva de entreter, então não se importará de ver mais uma sucessão de carros quebrando, bombas explodindo e porrada comendo. 

É justamente essa suspensão de descrença que marca o fervor que muitos (e me incluo nisso!) ainda têm pelos filmes de Velozes e Furiosos, afinal ninguém é de ferro e às vezes é necessário algo mais light do que a verborragia conceitual de cineastas mais complexos. Para esse alívio que existem franquias como essa e, talvez por isso, que a gama de espectadores permaneça tão fiel ao que esta representa, sempre mantendo esse entretenimento como fator primordial na produção dos filmes. Talvez a família, de que Dom (Vin Diesel) e sua turma tanto falam, sejamos nós. Resta apenas saber se realmente não abandonaremos essa família.

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