sábado, 28 de janeiro de 2017

Sem Mais Delongas #16: A estranheza na lógica binária.

(ou como a contemporaneidade "ama" a humanidade e odeia o seu semelhante).


A binariedade como proposição lógica é uma das mais antigas (e opacas) tradições filosóficas. Em Da Interpretação, Aristóteles postula o que ficou conhecido como princípio da não-contradição, ou seja, em um confronto de proposições contraditórias (em que uma anula a outra), uma destas é obrigatoriamente verdadeira e, obviamente, a outra é falsa. Não há possibilidade, segundo Aristóteles, de algo ser e não ser, simultaneamente. Salvo quando vista sob à luz de algum tipo de ambiguidade característica. Contudo, com o avanço do curso histórico, essa noção aristotélica se perverteu em uma bivalência um tanto quanto estúpida.

Quando se estabelece um tipo de discussão analítica sobre algum tema, é instintivo que se imaginem proposições adversas de perspectiva. Contudo, a natureza intrínseca do processo analítico é composto de diversas nuances que alternam, invariavelmente, a essência do assunto discutido. Tentar promover um valor-verdade baseado apenas na anulação da adversa, apenas anula a característica profunda de toda investigação filosófica: o questionamento, puro e simplesmente.

Tendo dito isto, trato como algo um tanto quanto surreal a aplicação dessa mesma lógica em um espectro de amplitude maior. A discrepância do confronto de ideias opostas com relação ao confronto de situações, sociais e econômicas, é abismante. Sendo assim, merecedoras de um tratamento mais profícuo. É por isso que, nos tempos cotidianos, a relação feita entre os fatores exclusivos de um determinado indivíduo serem determinantes para um outro, me aparenta ser, no mínimo, um tanto questionável. A ideia de que o motivo de um indivíduo ser pobre é, necessariamente, consequência imanente da ação de um outro indivíduo que se favoreceu disto é, no mínimo, de validade questionável.

Partindo desse princípio, poderíamos também dizer que uma pessoa só é feia pela outra ser bonita. Ou que uma só é gorda, pela outra ser magra. Que uma é triste, pela outra ser feliz. Toda essa noção de que os fatores (ou atributos) de um indivíduo estejam externos à ele é, na sua essência, um completo menosprezo às preferências (e consequências naturais) do indivíduo. Mais uma vez, a delegação das responsabilidades fornece uma visão de mundo em que as pessoas não são mais conscientes de suas vidas e vivem, de forma alucinógena, em um lugar de fantasia.
"Dr. Jekyll and Mr. Hyde" (John S. Robertson, 1920).
Fruto de um constructo ideológico arregimentado durante os anos, toda essa noção irrefreável de interferência perante à existência do outro é, profundamente, ligada ao conceito esquizofrênico de igualdade que permeia boa parte dos discursos dos social justice warriors. De raiz um tanto quanto autoritária, tal assertiva é trazida ao debate público a fim de justificar um tipo de expropriação econômica dos indivíduos que teria o objetivo de quitar uma "dívida histórica".

Logo de cara, podemos ver como tal justificativa é um tanto quanto controversa, pois para isso seria necessário destruir toda a liberdade de uma sociedade livre. O jornalista e autor indiano Dinesh D'Souza, em uma palestra na Amherst College, apontou a hipocrisia dessa concepção, mostrando que tentar advogar uma compreensão dessas em um espectro que abranja toda uma sociedade, é simplesmente torpe. Todo tipo de caridade (ou ajuda) aos mais necessitados, se forçada, deixa de perder a sua razão moral e passa a ser, no seu cerne, uma perversão autoritária de comportamento.

O mais curioso nisso tudo é que estes se tornam muito confortáveis em suas posições hipócritas de seres bondosos, mas na prática só o que fazem é proliferar os seus discursos. Como bem conceituou Bastiat, em seu livro A Lei, a espoliação legal tem raízes profundas na falsa filantropia. É muito fácil se advogar por uma "justiça social" paga pelos outros, quanto não se está disposto a fazer algo por si próprio para que o problema seja solucionado. É por isso que, invariavelmente, tais posturas mostram suas verdadeiras faces e como pouco se importam realmente com os seus semelhantes, pois só o que querem mesmo é aparentar um "amor" (totalmente falso)  à humanidade.

domingo, 22 de janeiro de 2017

Sem Mais Delongas #15: Problemas de gênero.

(as forças caóticas do relativismo na crise de identidade).


O maior erro da análise contemporânea dos indivíduos é, ao meu ver, a insistência em traçar a mesma quase que inteiramente sob à luz da Sociologia. O menosprezo perante a Biologia e a Psicologia, como métodos analíticos de comportamento, é algo simplesmente assustador. É claro que os aspectos sociais são essenciais para o entendimento de um indivíduo, mas se forem colocados como objetos de um plano maior. Pois - há de se lembrar - mesmo tais aspectos podem ser estabelecidos baseados em preferências fisiológicas ou psíquicas. 

Contudo, a "intelectualidade" forja um panorama onde a análise comportamental é mero instrumento de sucessões "impostas" pela sociedade. É - no mínimo - desumano descaracterizar as preferências dos indivíduos como se estas fossem apenas sujeitas ao jugo da sociedade. É de uma arrogância enorme apontar que a forma de agir de um indivíduo, detentor de determinado aspecto, é gerada apenas externamente à ele.

A construção da identidade dos indivíduos, nas suas mais variadas ordens, parte de uma análise que perpassa por diversas disciplinas. Obviamente, isso não resultará em um padrão comportamental, haja vista que o ser humano é dotado, invariavelmente, de enorme complexidade. Contudo, ainda que não existam padrões, é perceptível a natureza de preponderâncias significativas que corroboram tais formas de tratamento.


Não se trata de tornar excludentes os não pertencentes à pluralidade, mas de respeitar a predisposição comportamental dos demais indivíduos. Por isso, é compreensível a especificação de objetos materiais (ou mesmo da linguagem) como detentores de uma natureza característica. É uma noção muito estúpida conceber as leis de mercado como não suscetíveis ao lucro (o que, consequentemente, perpassa pela maioria). Além disso, a Linguística demonstra - com as corroborações das predileções citadas anteriormente - a natureza de tais especificações. 

Dito isto, finalizo: as suas predileções são resultado de um processo característico seu, não compondo uma amplitude magnânima. Contudo, a predominância de determinados componentes justificam tais especificações e auxiliam no funcionamento do entendimento humano. É óbvio que uma identidade não ortodoxa deve ser respeitada e, claro, levada em consideração na produção de bens de consumo. Mas é arrogância demais esperar que a mesma seja privilegiada, a despeito das outras, no que concerne ao campo econômico, haja vista que a disparidade entre as demandas são gritantes.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Sem Mais Delongas #14: O fenômeno "Aquarius".

(ou como o jornalismo se tornou uma piada).


Eu acompanhei, durante os últimos meses, as constantes revoltas de jornalistas e sites "especializados" em cinema com relação a perseguição(?) que o filme brasileiro estaria sofrendo depois dos seus componentes terem protagonizado aquela pataquada no Festival de Cannes. Mesmo quando ainda não havia visto o filme, eu já criei um pé atrás com relação a todo esse rebuliço que a mídia estava criando, haja visto que o clamor que o filme gerou em Cannes não foi lá grande coisa.

Depois de algum tempo de ocorrido o festival (e do impeachment da ex-presidente Dilma já ter sido consumado), a poeira parece ter abaixado um pouco. Porém, eis que surge a lista de representantes nacionais de vários países para a categoria de Melhor Filme Estrangeiro no Oscar e a ausência de "Aquarius" na mesma para que, mais uma vez, a mídia retornasse com a ladainha de perseguição ao filme, quase nunca atentando aos aspectos que constituem a obra(?) de Kléber Mendonça Filho.

Já um tanto irascível com relação a toda essa situação, eu resolvi finalmente assistir ao tal "Aquarius". Afinal, o filme realmente poderia ser excelente e as revoltas seriam, ao menos, justificáveis. Contudo, tudo que eu pude ver foram uma sucessão de cenas tediosas e diálogos pueris. Nem mesmo o conceito por trás do filme (que poderia ser interessante, caso fosse bem elaborado) consegue aliviar o enfado de assistir "Aquarius".
"Aquarius" e o "golpe": a maior piada de 2016.
Mas, afinal, qual é a motivação da mídia por trás disso tudo? Simples, perpetuar uma história para o futuro; advogar em função de suas predileções ideológicas. É bastante óbvio que o mito do "jornalismo imparcial" - do qual muitos jornalistas tentam usar como escudo de suas motivações - é uma piada. Não é de agora que a mídia exerce um papel essencial para a propagação de ideais e histórias (muitas vezes mentirosas e/ou distorcidas) para a população, tudo em função de projetos alucinados.

O patrulhamento dos mesmos em defesa de suas inclinações ideológicas e/ou políticas é cada vez mais estridente e apaixonada. É óbvio que é impossível (especialmente em algo de teor opinativo) exprimir algo sem considerar suas visões a respeito do tema, mas dever-se-ia - ao menos - ter algum tipo de bom senso, pois o jornalismo atual parece viver em um mundo de fantasia; um mundo, esse mesmo, concebido por Thomas Morus. 

E é por isso que quando surgem pessoas ou plataformas que naveguem por fora desta corrente, estes mesmos sejam imensamente rechaçados pelo culto que o jornalismo se tornou. Pois, antes de tudo, a função política dos jornais (e de todo cidadão, se levarmos o pensamento até a última consequência) é, a priori, condenatória. Deve-se, sempre, ser cético com relação ao que a classe política, que em nada nos representa, faz. Por isso que, muitas vezes, os maiores jornalistas deste país são justamente aqueles que não passaram por um processo formal. Somos nós - que na banalidade de nossas existências - nos apresentamos como a alternativa confiável de informação.