terça-feira, 29 de dezembro de 2015

Dedo de Prosa #6: Star Wars VII - O Despertar da Força (2015)

Capa do filme.
O Despertar da Força. Eis que surge o título do novo filme da saga cinematográfica mais bem sucedida de todos os tempos. O prenúncio do desejo de toda uma geração iria se tornar real. Finalmente, poderíamos ter a experiência de assistir um filme de Star Wars nas telonas pelo mundo afora.

De forma tremendamente respeitosa e digna, J. J. Abrams e Disney trataram o projeto com muito cuidado. Além de apresentarem características clássicas dos episódios IV, V e VI (77, 80, 83), eles foram exitosos ao fomentarem a inserção de personagens demasiadamente marcantes, que certamente criarão milhares de fãs ao redor do mundo.

Os efeitos especiais são lindíssimos, muito diferente do aspecto artificial expresso nos episódios I, II e III, ou das remasterizações atrapalhadas da primeira trilogia. Fica claro o interesse em formar um universo mais "real", embora toda a atmosfera fantástica presente.

Tudo isso sem contar o tom nostálgico e emocionante de presenciar Han e Chewie novamente na Millenium Falcon... o reencontro de Han e Leia... tudo converge em uma simbiose de sentimentos sem igual. Tudo orquestrado magnificamente (como não podia deixar de ser) por John Williams.

A sensação que fica é que não é apenas a Força que desperta, mas toda a paixão de fãs e admiradores da franquia que retoma um vigor descomunal. Ao terminar o filme, está expresso nos olhos de cada espectador uma sensação de "quero mais", um sentimento que nos acomete de súbito. Talvez, afinal, seja essa a tão falada "força": o desejo irrefreável de acompanhar os novos capítulos de Star Wars.

quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

Sem Mais Delongas #6: O debate e a "retórica" política.

(ou de como é fatigante ser respeitoso)


Como grande admirador de filosofia que sou, acabei me tornando um contundente defensor da arte da dialética. Do diálogo saudável; da troca de ideias frutífera. Acima de tudo, penso que o respeito às posições contrárias é o primeiro passo para se constituir uma discussão sadia que terá como principal fator o engrandecimento intelectual de todos os participantes.

Contudo, o que se vê em prática no Brasil é a imagem de um cenário esdrúxulo. Torna-se comum, a cada dia, a aferição pejorativa das pessoas por suas posições. Passou-se a um patamar banal o fato de se julgar alguém pelo que pensa. Tornamo-nos juízes afirmadores do ódio; da animosidade. Carregamos em nós um caráter de aversão à todos aqueles que se manifestem contrários ao que pensamos. Pois somos os "donos da razão" e não há quem possa contestar isso.

Portamo-nos como crianças birrentas e parecemos não perceber isso. Torna-se a política, que já é vista com grandiosa aversão (devido a sujeira generalizada no ambiente governamental), numa ferramenta ainda mais atroz. E nós fazemos parte disso, ao deixar que sejamos entregues a todo esse bacanal intelectual.

Somos nós os prejudicados com tudo isso. Enquanto as polarizações e o rancor crescem, a vontade de quem quer realmente mudar alguma coisa diminui. Torna-se difícil externar o que quer que seja, sabendo que estaremos sendo subjugados a qualquer instante. Faz parecer que sábios mesmo são aqueles que se mantêm em silêncio, enquanto os corajosos sofrem com a merda sendo jogada em seus rostos.

Somos, afinal, meros espantalhos? Em qual momento erramos para chegar neste ponto, onde um simples dizer constitui o "direito" de um julgamento difamatório?

Fazemos com que pareça que somos a escória intelectual de toda uma geração, ao menos no que se refere ao meio político. Se há algo que deve primar em qualquer conversação é a disposição em entender as colocações que nos são opostas, só assim seremos honestos intelectualmente. Se isso não ocorre, talvez o melhor seja sermos sábios ao modo de Sócrates: assumindo que somos ignorantes.

domingo, 13 de dezembro de 2015

Dedo de Prosa #5: A Esperança - O Final (2015)

Foto promocional do filme.

A franquia estrelada por Jennifer Lawrence chegou ao fim, para a tristeza de seus fãs e a alegria de muitos odiadores da saga. Eu, particularmente, nunca vi nada demais na franquia. Tudo me parece uma grande tentativa de idealizar um governo autoritário da forma mais infantil possível. Um tipo de (perdoe-me Orwell) "1984 para crianças".

Mas o que esperar deste último capítulo da saga Jogos Vorazes? O final de A Esperança é uma repetição categórica de clichês e cenas previsíveis. A atuação da tão supervalorizada Jennifer Lawrence consegue ser a pior de toda a franquia, fazendo sua personagem: Katniss Everdeen, parecer uma garota insossa e sem nenhum atrativo marcante que se pode imaginar em um personagem envolto neste tipo de enredo.

O triângulo amoroso composto por Gale, Katniss e Peeta entedia do início ao fim. Sem contar as diversas sequências de cenas com frases piegas expressas pelo "casal" Peeta e Katniss.  A ausência da tensão (característica que marcou os dois primeiros longas da franquia) e o maniqueísmo barato do filme também não contribuem.

Toda a trama é discorrida de forma lenta e cansativa, com planos exaustivos que se tornam ainda mais difíceis de assistir pelas atuações fracas do elenco. A premissa de abordagem política se prende a uma narrativa maçante, não elaborando com maior acuidade aspectos desfavorecidos pelo plano de fundo psicológico dos personagens. Acaba que, o resultado que se pode extrair deste último filme da franquia, é que de voraz o filme só tem o nome. 

domingo, 6 de dezembro de 2015

Dedo de Prosa #4: A Visita (2015)

(a redenção de Shyamalan).


Capa de A Visita.
Há um bom tempo que M. Night Shyamalan se tornou - para mim - um daqueles casos de diretores que só fazem um filme que preste e depois fazem com que sua carreira se torne uma sucessão de fracassos. Devido a isso, quando eu li que Shyamalan iria fazer um thriller de baixo orçamento ambientado em gravações ao estilo found-footage, não tive como conter a minha primeira impressão de que viria mais um filme fraco pela frente. Quando - posteriormente - foi divulgado o trailer, esta minha primeira impressão apenas se intensificou. Contudo, em uma grata surpresa, o filme se mostrou ser muito mais que eu esperava.

Apesar de agir em um gênero de apelo fácil, Shyamalan traz uma película que não se limita apenas ao point-and-shoot e a estética amadora que impera em praticamente todos os filmes desse gênero. Não. Ele se propõe a trazer uma narrativa focada em uma tensão inerente aos enquadramentos rodados. Os personagens chegam, inclusive, a "enaltecer" o espaço. Tal característica faz com que a gravação em si se manifeste como um personagem. 

O enredo transcorre de forma claustrofóbica. Por mais que A Visita não possa ser considerado um filme assustador, o grau de tensão psicológica que é colocado nos personagens e nos acontecimentos que povoam a tela é atordoante. Os personagens principais - duas crianças - fizeram uma excelente atuação, onde ambos participam ativamente, sem esquecer que são eles próprios os responsáveis pela filmagem do longa.

Resultado: Shyamalan conseguiu tirar de um "último tiro" a sua possível redenção. Neste terrível ano que foi para o gênero terror, pode-se afirmar que A Visita figura entre os melhores filmes do gênero no ano. Um filme cômico (podendo até ser considerado como um "terrir") e angustiante, feito de forma simples e nas doses certas. Um último suspiro para uma carreira quase findada no cinema.

domingo, 29 de novembro de 2015

Thriller Night #2: Vile (2011)

Capa de Vile.
Lendo a primeira edição de Thriller Night (que você pode encontrar aqui), percebi que escolhi um filme muito "pesado" para servir de estreia para este quadro. Sendo assim, optei por um filme mais "leve" para amenizar um pouco o ambiente.

Vile é um daqueles filmes que dividem opiniões. Quem gosta de Jogos Mortais, provavelmente também gostará de Vile. Quem não gostar deste primeiro, provavelmente odiará esse filme. Mas, afinal, seria esse filme apenas uma película com um enredo "repaginado" de filmes como Jogos Mortais e O Albergue? É o que veremos...

Apesar da tradução do título: "Vile", significar vil, penso eu que o melhor adjetivo para descrever esse filme seja angustiante, pois é essa a sensação que se tem desde o princípio até o desfecho. Mas mesmo com as cenas de tortura e mutilações constantes em praticamente todo o filme, o enredo levanta questões (de forma discreta, mas o faz) que valem a pena serem refletidas.

Enredo: Após serem capturados, um grupo de 9 pessoas se encontra preso dentro de uma casa desconhecida, onde uma mulher em um vídeo lhes explica que o dispositivo colocado em suas costas servirá como um tipo de medidor para a missão que lhes será dada. Eles devem infligir, uns aos outros, a sensação de dor, para que assim possam coletar os químicos necessários, sendo estes possíveis de coletar apenas pelo ocasionamento da dor. Para completar a missão, eles devem alcançar 100% numa tela instalada no local. Eles terão vinte e duas horas para completar essa tarefa.

Durante boa parte das cenas, somos apresentados a um tipo de embate moral alimentado pelo jogo psicológico (e, logicamente, físico) no qual os personagens são colocados. A cada sessão de tortura infligida aos personagens, a tensão e a violência inerente ao instinto de sobrevivência começam a aflorar. É chegado o momento em que um dos personagens propõe que alguém em específico seja violentado com maior intensidade, para que, assim, as demais pessoas não tenham que sofrer em demasia.

O instinto de sobrevivência se manifesta como uma manobra rumo a uma imagem caótica de mundo, onde os valores morais são descartados e tudo o que prevalece é o egoísmo humano. Este que se torna, a cada dia, uma característica mais presente na humanidade. É como se o interesse pessoal - o famigerado egocentrismo - se sobrepusesse a qualquer virtude que a união possa manifestar. Nos imagine com amplitude: o reflexo de uma sociedade em ruínas.

O filme ainda abre um pequeno espaço para cutucar a indústria farmacêutica, usando uma analogia (bastante longínqua, diga-se de passagem) que faz referência ao processo de experimentos em pessoas para provar ou não a eficiência de algum medicamento. Tal manifesto fica claro logo no início, quando aparece - em letras garrafais - uma frase (supostamente) dita por Gandhi: "A raiz da violência é a ciência sem humanidade..."

Seríamos nós (humanidade) um reflexo do que Vile mostra? Os mesmos ardis e picuinhas, porém não expressos de forma tão violenta? Afinal, em qual patamar podemos colocar nossa consciência com relação àquilo que vivenciamos e deixamos de legado para o mundo?

sábado, 31 de outubro de 2015

Suici.De.Pression, por Thy Light (2007)

Capa de Suici.De.Pression.
Quem me conhece sabe o quanto sou um consumidor assíduo de música e que sempre procuro estar conhecendo novos materiais. Nas andanças em busca de um som, eis que pesquisando um pouco sobre o gênero DSBM (Depressive Suicidal Black Metal) encontro uma banda brasileira (Limeira-SP) chamada Thy Light. Curioso pelo título bem bolado de um dos discos, resolvi ouvir Suici.De.Pression. Quando terminei de ouvi-lo, não consegui conter o meu êxtase (que naquele instante estava travestido de agonia) e decidi que deveria escrever sobre tal som.

Imagine um grito de agonia; uma última tentativa de tentar não consolidar um estado de depressão; uma forma, mesmo que fria, de se manter vivo; então... é este o caminho percorrido ao se ouvir o disco. Poucas vezes tive uma experiência melancólica tão forte com um disco quanto ouvindo "Suici.De.Pression". Pelo que me recordo, no momento, apenas "V - Halmstad (Niklas Angående Niklas)", da banda sueca Shining, me causou impacto parecido.

Já na primeira música: "Suici.De.Pression (Introduction to My End)", o tom melancólico do disco toma forma na magistral beleza que apenas um piano consegue propiciar. Na seguinte música: "In My Last Mourning...", a atmosfera de agonia ressalta e os riffs pesados e o vocal gutural se intercalam com melodias suaves. 

Nos versos desta música, é dito: "Os ponteiros do relógio batem. Sinto pulsando em meu peito toda a agonia de mais um dia neste mundo de escuridão. Através das minhas narinas, corre o cheiro da minha própria morte impressa no céu cinzento de domingo. Eu me matei... eu tirei a minha vida. Em meu último pranto, eu percebi, eu sempre fui o nada que eu temia me tornar."

Na sequência, a terceira música: "A Crawling Worm In a World of Lies" surge, dando continuidade ao clima inóspito. Nos versos, é dito: "Desolado. Apenas assisto o caminho que trilhei para chegar até aqui. Tudo em vão. Nenhuma recompensa para me fazer levantar a cabeça. Amarga foi minha derrota. Vejo o céu coberto com a fumaça cinza que meus olhos nunca foram capazes de suportar. Na realidade decadente... eu sou apenas um verme rastejante em um mundo de mentiras."

Na quarta e penúltima música, o teor caótico se agrava, surge: "I Am the Bitter Taste of Gall", nela se ouvem os versos: "Contemplo a força decadente da natureza forjada que eu tenho sido forçado a admirar. Nada disso é mais especial, então um projeto amargo ao nascer do sol. Eu sou apenas carne ligada a ossos que não tem outro propósito, que não seja apodrecer. A beleza de tudo o que já ansiou ser belo é apenas maquiagem em escória existencialista. Eu sou o gosto amargo de fel que circula nas veias daqueles que ainda consideram a penitência eterna um presente divino. Todos os seus ídolos estão mortos. Eles morreram em vão. Pra quê? Vida?"

E agora, como diz o próprio título da última faixa do disco: "...and I Finally Reach My End", aqui termina o caminho trilhado por Paolo Bruno (único integrante da banda) em seu disco. Esse é - em definitivo - um disco que elevará para outro patamar este gênero. Usando de uma técnica fascinante, o disco soa fora de sintonia, produzindo um som sombrio e desolador. Morto; assim como o seu final...

quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Thriller Night #1: Gurotesuku (2009)

Capa de Gurotesuku.
Sejam bem-vindos ao novo quadro deste choruminoso blog. "Thriller Night" terá uma edição todo mês e falará sobre filmes de terror/horror, com uma proposta de narrativa mais impessoal e despojada (embora eu saiba que não vou conseguir fazer isso). Se você curte a temática, espero que goste do que vou lhe apresentar aqui.

Pensei por um tempo sobre qual filme iria falar nesta primeira edição do quadro. Quem me conhece, sabe que prefiro MUITO mais os filmes de horror que são voltados para violência. Esses filmecos de demônio de quinta categoria que se espalham pela sétima arte, me causam urticária. Tendo dito isso, fica claro (apenas pela capa) o porquê do escolhido ter sido Gurotesuku (mais conhecido internacionalmente pelo título em inglês: Grotesque). Mas, deixemos de enrolação e vamos ao filme.

Se me pedissem para adjetivar essa película, eu não conseguiria pensar em nenhum melhor adjetivo do que o próprio título: "grotesco". O filme, que se desenvolve - quase que inteiramente - em uma sala de tortura, é uma sucessão de cenas doentias e insanas. Contudo, o filme não é só isso. Durante o transcorrer da história, é notório a 'insistência' do torturador com o diálogo ocorrido entre o "casal" antes de serem capturados.

Mas, aí você me pergunta: em quê caralhos consiste esse diálogo? Basicamente, a moça - logo após ter o primeiro encontro (sim, o primeiro!) com o rapaz - pergunta se ele morreria por ela (bem frase de romance do século XIX, não?). Motivado por isso (ou talvez não, como indica o final do filme) o torturador os ataca.

Já capturados, o casal acorda em uma sala escura, presos por correntes à uma 'cama' de metal. Logo de início, o torturador aplica seu primeiro golpe, perfurando o corpo do rapaz com um objeto pontiagudo. A partir daí, o roteiro - bastante propício - nos mostra o 'caminho' que trilharemos durante o filme. Segundo o próprio torturador, tudo o que ele quer é que os dois o excitem com sua vontade de viver. E é isso que ocorre.

Ele abusa sexualmente dos dois, numa das cenas do gênero mais icônicas da sétima arte, onde ele faz com que um assista a barbaridade que ele faz com o outro. Ele arranca os dedos de ambos (deixando apenas o polegar) e cria dois colares de dedos, para que um use os dedos do outro no pescoço. Ele decepa dezenas de membros, como, por exemplo: os mamilos e o braço da mulher, o olho do homem, além de - acredite se quiser - pregar três pregos (parecidos com aqueles usados na crucificação de Cristo) nos testículos do rapaz. Mas... o ápice só é alcançado quando ele decepa o pênis do rapaz, que faz isso para salvar a pele da sua amada. "Eu senti estimulação sexual", diz o torturador. E assim se encerra a sessão de tortura (será mesmo?).

Mas o que não ficou claro nas últimas linhas é que: todas as barbáries cometidas pelo torturador são estimuladas pelo amor do rapaz, que na ânsia por tentar salvar sua amada, se rende para tudo o que lhe possa acometer. Como eu disse no meu último post (que você pode ler aqui): afinal, até onde vai o limite do amor? Realmente é justificável qualquer atitude sob a "luz do amor"?

Bom... voltando. Depois de conseguir o que queria, o torturador trata dos ferimentos do casal e todo o ambiente caótico e sombrio do filme se transforma. Prometendo libertá-los assim que os ferimentos estejam totalmente curados, ele começa a tratá-los da forma mais cortês possível, afirmando que se entregará para a polícia e deixará para eles sua fortuna de 700 milhões de yens (moeda japonesa).

Contudo, qual o problema em tirar mais um pouco de ouro do pote? Contrariando sua promessa, ele os leva de volta à sala de tortura, onde resolve fazer uma nova experiência. "Agora poderá provar se está preparado para morrer por ela", diz ele. Ligando as tripas do rapaz à um gancho, ele explica que o rapaz terá de ir andando (com suas tripas pra fora) até onde a sua amada se encontra. Contudo, as tripas dele só alcançam até um determinado lugar. Chegando lá, o rapaz encontrará uma tesoura, que usará para cortar suas tripas. Após isso, basta que ele corte as cordas que prendem sua amada e ambos estarão livres.
Rapaz cortando suas tripas para salvar sua amada. Ah, o amor...
Porém, o rapaz não consegue. Quando estava muito próximo a conseguir, ele desmaia.O torturador, insatisfeito com o desfecho de seu 'jogo', resmunga: "Acabou? Que patético!". Sem poder extrair mais nada do rapaz, ele volta sua atenção para moça. "Mostre-me sua vontade de viver", diz ele, mas ela já não aparenta mais ter alguma vontade de viver. Após despejar toda sua repulsa em cima do torturador, tudo acaba em uma sucessão de acontecimentos caóticos.

Agora você me pergunta: tá, mas em quê esse filme vai acrescentar pra mim? Em suma, nada. Diferentemente de outros filmes bestiais que já falei aqui, nesse não há um significado oculto ou algo de conceitual, é apenas isso. Gurotesuku é um filme doentio, feito para pessoas que gostam de assistir esse tipo de atrocidade. Se você não é uma delas, assistir estas cenas chocantes pode se tornar algo perturbador. Portanto, pense bem antes de tentar.
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Últimos comentários: Gurotesuku tem uma trilha-sonora lindíssima, o que contrasta inteiramente com a atmosfera bestial do filme. Embora não seja gravado em primeira pessoa e não tenha as características de um snuff movie, esse filme espanta pela aparência crua e realística que suas cenas apresentam.

domingo, 4 de outubro de 2015

A Vida é Curta #1: He Took His Skin Off For Me (2014)

Quem já teve o desprazer de me conhecer, deve ter percebido minhas profundas suspeitas acerca da genuinidade de sentimentos como o amor, por exemplo. Seja como for, a proliferação da ideia de que o amor é algo acalentador está constantemente presente na sociedade. Veremos isso em He Took His Skin Off For Me (Ele Arrancou Sua Pele Por Mim)?

TCC (trabalho de conclusão de curso) de Ben Aston para a universidade: London Film School, He Took His Skin Off For Me contou com o apoio de cerca de 200 pessoas e levou dois anos para ser realizado. Com 0% de computação gráfica, todo o visual assumido pelo ator Sebastian Armesto é montado a partir de mil próteses que simulam os músculos humanos. He Took His Skin Off For Me é um trabalho lindíssimo, em todos os aspectos. Conceitualmente preciso, visualmente magnífico e musicalmente encantador.

Até onde vai os limites do tal famigerado amor? Ações estapafúrdias são justificáveis se vistas à luz do amor? Afinal, será que realmente vale tudo no amor? Quais consequências uma atitude impensada e impulsiva como essa podem causar? Essa é a mensagem metafórica escondida neste belíssimo curta do principiante diretor londrino Ben Aston, baseado no conto homônimo de Maria Hummer.

Entretanto, há mais um aspecto subentendido neste curta-metragem. Afinal, o que se poderia definir como pele (skin)? Seria essa pele apenas a representação física da hepiderme humana ou seria essa pele - também - a definição da pessoa em si? A pele é aquilo que você é, a sua essência. Logo, ele se desfaz dessa particularidade em função de sua relação; à pedido da sua esposa. Em prol do "nós".

Porém, com as diversas dificuldades geradas por ter arrancado sua pele, o homem começa a se arrepender de ter feito esta escolha. Afinal, seria mesmo prudente uma relação onde um dos componentes têm de sacrificar a sua essência para demonstrar o seu comprometimento? Se você precisa mudar aquilo que você é para estar com alguém, será que você realmente deveria estar com esta pessoa?

Mas aí vem a pergunta final: apesar desta demonstração de sacrifício... e o outro lado? Estaria a outra parte desta relação tão disposta a fazer esta mudança em prol do firmamento de um relacionamento mútuo? A natureza egoísta e egocêntrica do ser humano permitirá que essa reciprocidade ocorra?

Se você gostaria de tentar ver uma outra visão sobre o amor, este curta lhe servirá de mão cheia. Você está disposto a arrancar sua pele por alguém?

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Dedo de Prosa #3: The ABCs of Death (2012)

Capa de The ABCs of Death
Há algum tempo que venho batendo na tecla que o gênero terror/horror sofreu uma queda considerável na qualidade de suas produções nos últimos anos. Por isso, resolvo hoje falar sobre este filme, que parece ser a redenção de todas as produções tacanhas e sem graça que tem sido lançadas nos últimos anos.

Para começar, tenho de fazer uma ressalva. Este não é um filme de terror no qual você irá se assustar. Pelo contrário, em muitos momentos você poderá até dar umas boas risadas.

Como está exposto na própria capa do filme: '26 Directors | 26 Ways to Die', esse filme tem uma proposta ousada e instigante. Foi dado a 26 diretores ao redor do mundo uma letra do alfabeto, na qual eles têm a missão de fazer um curta cujo título comece com a letra que lhes foi dada, com o adendo de que todos os curtas tratem da temática morte, de alguma forma.

Sendo assim, cada curta tem as suas particularidades. Não falarei de todos os curtas aqui, apenas falarei dos que mais gostei. Mas posso te adiantar uma coisa: o filme é muito nonsense, hilário e ousado. 

FART: (escrito e dirigido pelo japonês Noboru Iguchi) - esse curta centraliza-se em uma garota que não acredita em Deus, pois, segundo ela, "se Deus existisse, garotas delicadas não teriam vergonha de peidar quando quisessem". Ao invés de Deus, a menina acredita que a Srta. Yumi (sua professora) é que a protege. Então, há um surto que espalha uma fumaça por toda a cidade, fumaça esta que a garota se pergunta se seria um peido vindo da bunda de Deus (será?). Ao conseguirem escapar, a menina diz à professora que não quer morrer cheirando aquela fumaça, nas palavras dela: "se eu tiver que morrer, será cheirando o seu peido." Bom... o resto vocês já podem imaginar.
Srta. Yumi peidando na cara da menina.
KLUTZ: (escrito e dirigido pelo dinamarquês Anders Morgenthaler) - esse curta realizado em forma de animação consiste, basicamente, na ideia de uma mulher que, após cagar, não consegue se livrar do dejeto que produziu. Ele a atormenta de diversas formas, até que o "supercocô" se joga para voltar ao ânus da mulher, que morre com a intensidade da penetração do dejeto.
Mulher usando sutiã para tentar se livrar do dejeto que produziu.
LIBIDO: (escrito e dirigido pelo indonésio Timo Tjahtanto) - esse curta centraliza-se na ideia de uma competição de masturbação entre dois adversários, onde ambos têm de se masturbar para uma atração que será apresentada. O primeiro que gozar vence. O perdedor morre com uma estaca que atravessa desde o ânus até a boca. O rapaz cujo qual a cena gira em torno vence por doze vezes, tendo como atração até mesmo uma jovem (que aparenta ter algo em torno de 12/13 anos) com a perna amputada se masturbando com sua prótese. No 13º estágio da competição ele perde, pois se recusa a se masturbar para um homem transando com uma criança (aparentemente de 7/8 anos). Sendo assim, no próximo estágio ele se torna a atração. Ele faz sexo com uma mulher, que momentos depois o mata com uma serra elétrica enquanto os dois fazem sexo.
Garota perneta se masturbando com sua prótese.
NUPTIALS: (escrito e dirigido pelo tailandês Banjong Pisanthanakun) - esse curta é focado em um homem que compra um papagaio de estimação para mulher. O papagaio é ensinado pelo dono a pedir a sua mulher em casamento. Ele o faz e tudo corre tranquilo, aparentemente. Porém, após o pedido, o papagaio repete a conversa que seu dono teve com a amante enquanto traía sua mulher (recém noiva), imitando até mesmo os gemidos da amante. A mulher, enfurecida, esfaqueia o seu noivo com a faca de cozinha com que cortava um pepino.
O homem, exibindo seu papagaio para sua mulher (leia sem o duplo sentido).
WTF?: (escrito, atuado, produzido e dirigido pelo estadunidense Jon Schnepp) - este é, provavelmente, o curta mais nonsense do filme (o que acaba justificando o título). Usando de metalinguagem, o diretor aparece junto com seu parceiro de filmagem, discutindo sobre as ideias para o curta, até que uma mulher aparece em seu quarto pedindo para que os dois venham a sala de estar para verem o que passa no noticiário. A transmissão do noticiário informa que aviões percorrem o céu, emitindo um gás estranho e que as pessoas estão entrando em pânico, chegando a dizer que viram até palhaços-zumbis nas ruas (e enquanto isso, o diretor percebe a aparição da letra W, tanto no céu como na transmissão da televisão). Até que, uma voz surge anunciando que os Ws que apareceram constantemente representam o anúncio de uma suposta profecia autorrealizável, que levará a humanidade a extinção. A sequência de cenas que vêm a seguir desse momento são tão absurdas e sem nexo que não vale sequer a tentativa de tentar explicar. Portanto, assista o filme.

A cabeça do diretor, sendo esfaqueada pela (morte?).
XXL: (escrito e dirigido pelo francês Xavier Gens) - o curta em questão faz (acredite se quiser) uma leve crítica à sociedade impositora de padrões estéticos. O curta é focado em uma mulher obesa, que é vilipendiada a todo instante, enquanto está voltando para casa. Pressionada por essa imposição estética, a mulher começa a se cortar, na tentativa de eliminar a gordura excedente de seu corpo. Usando de uma faca de cozinha, uma gilete e uma pequena serra, ela mutila o próprio corpo para alcançar o padrão estético instituído pela sociedade moderna. Ao final da mutilação, ela aparece totalmente desfigurada, porém, aparentemente satisfeita com o resultado. Poucos segundos depois, ela morre.
Mulher, satisfeita com sua novíssima silhueta fina.
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Bom... é isso o que eu tinha para escrever. Gostaria de ressaltar apenas que esses foram os curtas que eu mais gostei, o filme proporciona muitos outros curtas que poderão lhe agradar mais do que estes. Portanto, assista ao filme e, se interessar, compartilhe o que achou no espaço para os comentários.

Descobri recentemente que há uma sequência desse filme chamada The ABCs of Death 2. Quando assistir, pretendo escrever sobre ele. Portanto, fique de olho no blog que logo, logo eu volto a aparecer.

terça-feira, 8 de setembro de 2015

Transgressividade #8: O Vídeo de Benny (1992)

Capa de O Vídeo de Benny.
Michael Haneke é - na humilde opinião deste ser que vos escreve - um dos maiores diretores do cinema contemporâneo. Seus filmes repletos de críticas sociais e cenas icônicas mantém um lugar especial em minha mente. Já passou da hora de falar de um filme desse peculiar diretor.

A escolha do filme foi demasiado complicada, visto que Haneke tem vários filmes excelentes. Contudo, restringi as opções àquelas que mais se aproximam a temática do meu blog (se é que existe alguma). Optei por Benny's Video e você entenderá o motivo nas linhas que virão a seguir.

Especialista em críticas sociais no mundo cinematográfico, Haneke fez um filme com o objetivo de mostrar a glamourização da violência no meio midiático e/ou a forma com que uma criação negligente e sem acompanhamento que alguns pais dão ao filho podem influenciar na sua maneira de pensar e agir. 

Vagando entre esses dois pontos, Haneke monta um filme encabeçado pelo protagonista Benny, interpretado por Arno Frisch, um adolescente que, devido a ausência dos pais, tenta compensar sua existência vazia com o consumo de filmes e fitas, prioritariamente, de conteúdo violento. Dentre as gravações favoritas do rapaz, está a fita (ao estilo snuff movie, gravada pelo próprio Benny) de um porco sendo abatido com uma arma de ar comprimido (imagem abaixo).
Porco sendo assassinado.
Particularmente, eu não gosto de assistir nada que contenha violência contra animais. Essa cena, em particular, é demasiado impactante. Não somente pela cena em si, que já é densa pela forma como foi filmada (com a sonoridade crua, que contribui para deixá-la ainda mais intragável), mas também pela frieza que os assassinos abatem o suíno. Frieza essa que se pode ver nos personagens do filme, que parecem não se importar com a cena. Isso se torna evidente com o discorrer do filme.

Contudo, eu gostaria de fazer um parêntese aqui. É curioso como nós, humanos, de uma forma geral, sentimos um sentimento de angústia ao vermos um animal sofrendo algum tipo de maltrato, mas quando isso se trata da nossa própria espécie, nossa reação não é tão revoltosa quanto. 

Não estou dizendo que acho errado alguém se sensibilizar com o sofrimento de um animal, longe disso. Apenas fico com uma arguição: será que a violência no meio social está tão recorrente que já nos adaptamos com isso e todas as atrocidades cometidas pelo mundo já não nos espantam e chocam mais? A humanidade se põe tão negligente ao ponto de achar a violência generalizada algo comum e rotineiro?

Bom... prossigamos com o filme. Em um fim de semana em que os pais viajam, o rapaz fica sozinho em casa. Ao ir na locadora de filmes, ele encontra uma garota desconhecida e a convida a ir com ele até sua casa. Inicialmente, tudo ocorre de forma leve, até passa uma leve impressão de um "romance juvenil".

Em determinado momento, o rapaz decide exibir a fita do porco para a garota. Ela não parece se chocar tanto com a cena. Porém, o rapaz retira de onde estava escondido, a arma de ar comprimido usada para matar o porco. Ele exibe a arma para a garota e em seguida pede para que ela atire nele. Ela recusa. "Covarde", diz ele. "Você que é covarde", ela retruca.
"Aperte", diz Benny para a garota.
Então, ele pega a arma e aponta a cuja para ela. "Aperte então", ela diz. "Covarde", ela completa. E então... ele aperta. A garota cai. De início, a reação do rapaz é natural, mas com os gritos agonizantes da garota, ele perde o controle. Descontrolado, o garoto dispara mais duas vezes. A garota morre.

Depois de assassinar a garota, Benny relaxa, e isso é o que mais assusta. A forma como os personagens de Benny's Video agem com total frieza e naturalidade perante um ato de violência (e morte, nesse caso) é agoniante. Logo após assassinar a garota, ele faz um lanche e come, incrivelmente sereno. Até mesmo quando ele está limpando o sangue do corpo, a impressão que passa é que ele está passando pano na casa. Uma atitude corriqueira; natural.

A partir daí, o garoto começa a ter um comportamento estranho. Ele raspa o cabelo, bate no seu melhor amigo em plena sala de aula, leva uma suspensão da escola e intensifica ainda mais sua atitude misantrópica. Ao ser questionado por seu pai sobre o motivo daquele comportamento "rebelde", Benny revela aos pais o que ocorreu, mostrando a gravação da morte da garota em meio a outros programas televisivos.

Agindo de forma totalmente fria e indiferente, Benny é levado a viajar com a mãe para o Egito, enquanto o pai esconde o corpo e se assegura de que conseguirá acobertar o ocorrido. Já no Egito, Benny prossegue com suas gravações. Em uma curiosa cena, onde Benny e sua mãe estão deitados assistindo televisão, ela desata a chorar. É apenas por meio da televisão que sua mãe consegue esboçar algum tipo de reação para toda aquela situação.

Ao voltar para casa, Benny denuncia os seus pais para a polícia. O filme termina com o título do filme sobreposto na imagem da câmera de segurança de um corredor onde os pais se encontram. No final, se percebe a cruel ironia que Haneke nos oferece. A transformação de Benny na persona vista em suas gravações, a persona em que esta glamourização o levou a se tornar.

Benny não detém a posse de sua existência, ele delega esse "fardo" a sua auto-reprodução. O fruto de uma sociedade asséptica e recheada de impessoalidade. Uma imagem; friamente disposta em um mundo cinzento e inóspito. Só resta uma arguição: se Benny vê um vídeo, e o que se acaba de ver é "o vídeo de Benny", seríamos nós levados aos mesmos passos de Benny?
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Umas poucas palavras sobre o diretor...

Haneke - definitivamente - é um diretor para poucos. Suas obras "chocantes" trazem uma atmosfera fria; crua. Sua visão de mundo é de enorme frieza, onde as pessoas reprimem seus sentimentos para tentar sobreviver em uma sociedade sem cor e sentido. Um lugar inóspito, onde não se há razão de ser.

Talvez - por essas e outras - que seus filmes figurem na mente de poucos cinéfilos, pois a natureza apática de seus filmes não agradam a muitos. Parece que, pensar, nos dias atuais, que o cinema ainda pode ser feito com uma câmera na mão e uma ideia na cabeça, deixa algumas pessoas desconfortáveis.

terça-feira, 28 de julho de 2015

Sem Mais Delongas #5: Qual vive um pior momento no cinema: romance ou terror?

Em tempos onde filmes como A Entidade, Annabelle, O Exorcismo de Emily Rose e outras merdas do gênero são consideradas por uma parcela de pessoas como bons filmes de terror e atrocidades cinematográficos como O Diário de Bridget Jones, A Culpa é das Estrelas, P.S. Eu Te Amo e outras bostas são consideradas por outra parcela como romances incríveis, surge a pergunta: no cinema contemporâneo, qual gênero vive um momento mais calamitoso: romance ou terror? Ou até mesmo: entre os dois gêneros, qual tem um público menos rigoroso?

É muito triste para os admiradores do gênero romance que encantam-se ao assistir joias como ...e o Vento Levou, Casablanca e Último Tango em Paris, ver no que os filmes de romance se tornaram. Tão triste é ver que o gênero terror, que nos impactava com clássicos como PsicoseO Exorcista e Sexta-Feira 13, hoje fiquem a mercê de filmes que não conseguem nada além de causar tédio.

Realmente me deixa pasmo a baixa qualidade com que se tratam os dois gêneros nos tempos atuais. O mais curioso é que, mesmo não acrescendo em nada e sendo filmes apenas 'mais do mesmo', esses filmes continuam tendo boas bilheterias e retornando uma quantia até maior do orçamento que foi direcionado ao filme.

O fluxo de produções cinematográficas é tão grande e de qualidade tão baixa que a rigorosidade ao se assistir um filme parece que se tornou algo desnecessário. O show business está cada vez mais voltado para o business e menos para o show, isso me causa uma consternação tremenda. Chega a ser enfadonho ter que ver aonde moro sessões praticamente vazias de filmes interessantes como Kingsman: The Secret Service e ter de se deparar com salas totalmente lotadas para assistir um filme tão tedioso quanto A Culpa é das Estrelas.

Mas o mais triste de tudo isso é ver filmes de ambos os gêneros com propostas interessantes - como a compilação de curtas The Abc's of Death, por exemplo - não chegarem a grande massa. Parece que o público já se acomodou a "assistir apenas o que está passando". Falta interesse por parte dos produtores em fazer algo de qualidade e interesse dos espectadores em pesquisar, em vez de apenas se contentar com o que lhe está "palpável".

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Sem Mais Delongas #4: Efeito Joseph Merrick

Os conceitos de beleza e feiura estão em todos os lugares, sendo, boa parte destes, incitados por uma maioria circunstancial da sociedade desde quando nascemos. Historicamente, o belo e o feio são associados a outros conceitos, ao certo e o errado, ao bel e o mal, e diversos outros. Exemplos dessa associação são encontrados em religiões, quando, por exemplo, é mostrada a figura "bela" de Cristo ao lado da "feiura" de Lúcifer.

Mas, o que de fato é a beleza e a feiura? Será possível afirmar tão categoricamente o que realmente é belo e feio? Levando para um âmbito estético, os padrões de beleza foram mudando conforme o tempo passou. Há 50 anos atrás, a beleza feminina era dada através de seios pequenos, atualmente, devido à influência dos norte-americanos, esse conceito foi mudado. Percebe-se, então, que a beleza é subjetiva, as circunstâncias em que esses conceitos são afirmados são temporais e parciais.

Enquanto o conceito de beleza se altera, a feiura continua estagnada em como é vista por essa maioria de circunstância. Há séculos que a feiura é tratada como a ovelha negra da sociedade. Existem também aqueles que afirmam existir algum tipo de beleza interior, sendo esta a compensação dos vistos como feios. Porém, assim com a beleza estética, a pouco crível beleza interior também é subjetiva. O fato é que, infelizmente, a beleza tornou-se algo necessário, enquanto a feiura tornou-se algo digno de repúdio.

Isaac Watts, em pleno século XVIII, escreveu: "pudesse eu recriar-me novamente, não te decepcionaria". Esse verso mostra como somos fomentados a aderir um conceito sem dar a devida importância ao que pensamos por nós mesmos. Um homem disposto a se recriar somente para agradar a outrem, é algo lamentável. Essa instigação faz com que deixemos de lado nossos conceitos e passemos a ser, cada vez mais, escravos da pluralidade.

quinta-feira, 9 de julho de 2015

Setevidas, por Pitty (2014)

Pitty - a "princesinha" do rock brasileiro - reinventou radicalmente o seu jeito de fazer música com o seu mais novo disco "Setevidas". Passaram-se cinco anos desde o seu último álbum "Chiaroscuro (2009)" até chegar neste, e de lá para cá, alguma coisa mudou. 

Parecendo ter repensando sua carreira e sua musicalidade com mais acuidade, Pitty nos proporciona um ótimo disco, transpirando dor, agonia e esperança em cada música, com letras profundas e potentes. 

O motivo de toda essa tristeza? Talvez pela morte do guitarrista (e amigo) Peu Souza, ou a morte de sua gata - que estampa a capa do disco. Mas isso só ela pode dizer.

Gravado inteiramente ao vivo em estúdio - para eliminar qualquer traço de canastrice - e contando com uma ótima produção e mixagem, a cantora baiana faz um disco de primeira. Tendo em suas faixas: "Serpente" (praticamente épica), "A Massa" (letra poderosa) e a faixa-título "Setevidas" (um completo desabafo) o seu ápice.

Com uma proposta diferente do que já havia feito, com arranjos muito bem trabalhos - mesclando rock 'n' roll com um som psicodélico - e letras bem escritas conciliadas com o belo vocal ao qual já estamos acostumados, Pitty produziu esse que - na minha humilde opinião - é o seu melhor disco.

Provavelmente, os admiradores da fase mais 'pop' da cantora não gostarão desse disco, mas o que não se pode negar é que, assim como a última faixa do disco sugere, Pitty e sua banda parecem estar trocando de pele. Afinal, "a sustentação é que a manhã já vem".

Abaixo se encontra o videoclipe da faixa que encerra o disco: "Serpente".

quarta-feira, 8 de julho de 2015

Poetando: Ode ao Frio

O cair da noite me aquece,
extasiado pela brisa, o afago;
esfria meu corpo, que falece,
desfruto a brisa, olho o vago.


Sinto voltear-me o cerne,
o doloso sopro fúnebre,
esfriando a hepiderme,
causando-me deslumbre.


Com maestria concordante,
onde se nutre ao máximo,
segue o suspiro sibilante.


Ponho-me delirante,
frente ao frio átimo,
a dor abundante.

- por Felipe Monteiro

segunda-feira, 6 de julho de 2015

Dedo de Prosa #2: A Centopeia Humana 3 - Sequência Final

Muita espera houve por parte dos admiradores do filme pela terceira (e última) parte da trilogia A Centopeia Humana. O filme que, inicialmente, era para ser lançado em 2013, só conseguiu ser lançado no ano de 2015. 

Porém, apesar de toda a euforia por parte dos fãs com o trailer - que anunciava a criação de uma centopeia composta por 500 pessoas - as expectativas não foram correspondidas.

Claro que, a atmosfera gore continua presente, porém, parece que ela ficou em segundo plano no enredo. A centopeia sofreu um detrimento em meio ao enredo em função do personagem megalomaníaco Bill Boss (Dieter Laser), que causa exaustão com seus gritos e surtos psicóticos a cada 5 minutos do filme.

O impacto estético e psicológico que os dois antecessores causam também é muito maior que esse terceiro filme. Tom Six, em A Centopeia Humana 3, parece ter criado um filme com um tipo de metalinguagem no roteiro, com uma tentativa pobre de criar algum tipo de ironia. Forçando a barra com ofensas xenofóbicas, racistas e religiosas.

Os personagens foram mal trabalhados. A secretária promíscua interpretada pela belíssima atriz-pornô Bree Olson, que poderia ter sido um elemento a mais na franquia, transformou-se em mais um esteriótipo tacanho de secretária frágil. O diretor da penitenciária interpretado por Dieter Laser é extremamente maçante e causa tédio até mesmo no maior fã da trilogia. O único que consegue se sobressair é Laurence R. Harvey, que encarna o contador Dwight Butler com maestria.

As atuações são fracas, o enredo é chato e o roteiro mal escrito. Os dois primeiros filmes foram taxados como "filmes ruins" devido as cenas gore, mas quem assistir aos três filmes poderá perceber que, realmente, o filme ruim é esse terceiro. Não pelas cenas gore, mas pela baixa qualidade da produção mesmo.

O Enredo:

O diretor megalomaníaco da penitenciária (Bill Boss) sente-se diminuído pelos detentos, que o desafiam constantemente. Entres indas e vindas - que duram praticamente metade do filme - que vão desde as cenas onde o diretor queima o rosto de um detento que o desafiou com água fervente; quando ele corta os testículos (à faca) de um dos detentos; quando ele quebra os ossos de um detento na maior frieza, até chegar na (que na minha opinião, é a única cena bem feita do filme) hora em que o diretor sonha com os detentos o cercando, enquanto um deles abre um buraco em sua barriga e estupra o seu rim, ejaculando lá dentro. Entre cenas e cenas, o diretor finalmente resolver ouvir a ideia "genial" de seu contator para tornar - finalmente - os detentos submissos ao diretor.

Chamando o médico do hospital e o próprio diretor do filme Tom Six (que interpreta a si mesmo), ele percebe que a ideia de Dwight é "100% correta medicamente", sendo assim, a centopeia com 500 pessoas é viável para ser realizada. Os procedimentos para a realização da mesma são praticamente os mesmos, ligação da boca com o ânus da pessoa seguinte, criando a idealização de um intestino só. Há apenas alguns incrementos propostos por Dwight, mas que de tão insignificantes, sequer vale a pena serem lembrados.

Estando finalizada a centopeia, eles (Bill e Dwight) recebem a visita do governador, que no início do filme já havia vindo ver a penitenciária e que dera um prazo de uma semana para que Bill pudesse mostrar algum resultado. Sendo assim, Bill e Dwight trafegam pela penitenciária explicando, passo a passo, a teoria maluca da coisa toda. 

Segundo eles, a centopeia trará muitos benefícios para o governador, pois irá diminuir radicalmente os gastos advindos do sistema penitenciário, que não terá mais de se preocupar com gastos como: necessidade de policiais, comida e bebida; livros, televisão e habitação; até mesmo com as cercas, que já não serão mais necessárias. Tudo o que será necessário são líquidos baratos e injeções de vitamina, para poder manter os detentos vivos. Com isso, inclusive, o índice de criminalidade cairia drasticamente, pois as pessoas evitariam cometer qualquer tipo de delito, para que não tivessem que passar pela centopeia.

Após ser apresentado a essa teoria sem noção, o governador sente ojeriza, percebendo que aquilo fere dezenas de direitos humanos. Porém, mais à frente - após ter ido embora da penitenciária - ele repensa melhor a situação. Volta para a penitenciária e parabeniza Bill, dizendo que "isso é exatamente o que a América precisa". Após isso, ele vai embora e deixa Bill, que logo após, mata Dwight, pois percebe que a ideia partiu inteiramente de Dwight. E assim, termina o filme.
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A Centopeia Humana 3 não cumpriu com os dizeres de Tom Six, que em entrevista disse: "Este terceiro filme fará o segundo parecer um filme da Disney. Nós vamos fazê-lo totalmente nos Estados Unidos e será o meu favorito. Vai aborrecer um monte de gente." Não passa nem perto de fazer o segundo parecer da Disney. Mas, de facto, aborreceu. Por ser uma bosta!

terça-feira, 23 de junho de 2015

Vulnicura, por Björk (2015)

Como o título do blog já sugere, a temática central do meu blog é a dor, o sofrimento, seja ele manifesto por meio do meu próprio falar (em artigos que eu mesmo escrevo), ou em uma tentativa pobre de disseminar e/ou avaliar alguma manifestação artística. 

Sendo assim, eu não poderia deixar de falar do novo disco desta que é - na humilde opinião deste ser que vos fala - uma das maiores vozes da história.

O disco Vulnicura, da cantora Björk, é permeado - do início ao fim - como um manifesto da dor do fim de um relacionamento (Björk foi casada durante 13 anos com Matthew Barney. Os dois se separaram em 2013).

Diferentemente de álbuns anteriores como: (Medúlla [2004], Volta [2007] e Biophilia [2011]), a gama de experimentações musicais de diversos gêneros que permearam a carreira da cantora e compositora islandesa não estão tão presentes, os experimentos artísticos não se encontram como um elemento fundamental do disco. 

Contudo, sabendo conciliar as belas melodias que compõe com o que tem de mais encantador: sua voz, Björk consegue - mais uma vez - nos agraciar com um disco maravilhoso. Dessa vez com um aprofundamento muito mais pessoal e menos pedagógico, ela apresenta não somente um disco, mas quase que uma trilha-sonora, que deve ser ouvida integralmente, enquanto se pode deliciar-se com a viagem tresloucada ao psicodélico que o som nos proporciona.

Falando com um público abrangente e demonstrando que ainda se pode ter esperanças de boa música no mainstream internacional, Björk ainda mostra o porquê de ser uma das vozes poderosas que se pode encontrar.

Abaixo se encontra o videoclipe da primeira faixa do disco, onde se pode ver mais uma vez a cantora inovando. Um vídeo interativo gravado com uma câmera 360 graus.

terça-feira, 9 de junho de 2015

Transgressividade #7: Singapore Sling (1990)

Cáustico, mas brilhante. Singapore Sling é um daqueles filmes únicos na história do cinema, um filme que faz jus a fama da indústria cinematográfica grega. Repleto de cenas de perversão, Singapore Sling é uma película onde se pode encontrar de tudo: incesto, pedofilia, sadomasoquismo, cenas de vômito, culto à morte, canibalismo e diversas cenas fetichistas.

Ao exemplo de muitos filmes, Singapore Sling é um filme que não nos deixa claro qual o propósito de ter sido gravado. Na mesma linha de Subconscious Cruelty, essa película parece ter como única e exclusiva intenção chocar o espectador e mostrar ao mundo todos os podres da humanidade.

Gravado em preto e branco (lembrando o noir americano), com uma fotografia belíssima, uma trilha-sonora que remete ao romantismo clássico e atuações magníficas dos três personagens (especialmente da atriz Meredyth Herold, que faz o papel da filha), Singapore Sling entra para a lista dos melhores filmes já realizados na cena underground.

O Enredo:

Em uma mansão, duas mulheres (mãe e filha) vivem rodeadas por um cenário de perversão. A filha, quando menina, foi incluída nessa redoma de perversão por seu próprio pai, que tirou sua virgindade aos 11 anos. Após a morte do homem, mãe e filha resolvem dar prosseguimento as cenas atrozes.  

A mãe contrata serviçais que servem de instrumento para satisfazer os desejos e fetiches das duas. Apos usá-los, ela os mata, os devora (estripando o corpo e usando os órgãos como alimento) e, por último, os enterra.

Até que, um dia, um detetive fracassado aparece procurando por sua amada chamada "Laura", que foi trabalhar na mansão das duas mulheres e depois disso, desapareceu. O detetive, apelidado por elas de Singapore Sling (em 'homenagem' a famosa bebida, cuja receita estava em seu bolso) é colocado em cativeiro.

Sendo submetido a satisfazer os caprichos sexuais das duas mulheres, que transam entre si. Em uma das principais cenas do filme, a mãe transa com o detetive preso à tiras de couro enquanto o mesmo é eletrocutado. Para finalizar (com chave de ouro), ela ainda urina no rosto do homem (imagem abaixo).
Mãe, mijando em "Singapore Sling".
No decorrer do filme, a filha (que parece sofrer de esquizofrenia) intercala momentos onde parece assumir o papel de Laura, deixando em aberto a suspeita do detetive, que já não se encontra mais em um estado de sanidade plena. E assim a história continua, formando - entre cenas bizarras e obscenas - uma experiência cinematográfica excitante e hermética, onde o sexo e a perversão intercalam seus ápices. 

Não comentarei sobre o desfecho da trama, pois à ele não cabe uma mera avaliação grosseira. Deixo a cargo do leitor que tenha a curiosidade de assistir e se juntar aos apreciadores deste que é, independente da carga transgressora, um dos filmes mais provocantes que existem.
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Comentário do diretor e roteirista de Singapore Sling sobre o filme:

"Quando eu estava filmando Singapore Sling, eu estava sob a impressão de que estava fazendo uma comédia com alguns elementos da tragédia grega antiga. Mais tarde, quando alguns críticos europeus e americanos o caracterizaram como "um dos filmes mais perturbadores de todos os tempos", eu comecei a sentir que algo estava errado comigo. Então, quando a censura britânica proibiu a exibição do filme nas salas de cinema britânicas, percebi que, afinal, algo deve estar errado com todos nós."

- Nikos Nikolaidis

quarta-feira, 20 de maio de 2015

Sem Mais Delongas #3: Pornografia - arte ou vulgaridade?

Para iniciar, devo salientar que ao me referir a pornografia, não me refiro apenas a filmes pornográficos, mas a todo tipo de expressão sexual explícita que venha a ter um cunho artístico. Pintura, fotografia, literatura e demais outras formas de arte podem ser colocadas nesta categoria.

A expressão explícita do sexo é uma temática que durante os séculos foi abordada como uma desonra, algo digno de vergonha. Um ato, muitas vezes, tratado como algo feito apenas por sodomitas perversos ou coisas do gênero. E nos tempos atuais a ladainha continua a mesma. Assusta-me, de imediato, que um ato tão comum e inerente ao ser humano possa ser tratado com tamanha ojeriza. 

Embora muitos digam que a sociedade (falo prioritariamente do Brasil, pois é a sociedade na qual convivo) tenha alcançado níveis de libertinagem que beiram ao inexpressivo, o que se vê na prática não é exatamente isso. 

Os ditos pudicos e conversadores tentam corroborar a ideia (muitas vezes com argumentos de cunho religioso) de que o sexo é algo "sagrado", que deve ser preservado e blá-blá-blá. As amarras "morais" impostas em uma sociedade de séculos atrás ainda é sustentada por um punhado de asseclas que fazem dessa linha de pensamento retrógrada sua bússola moral, e isso é algo muito surreal.

Arte, por definição, é a expressão de uma percepção ligada aos instintos. É a forma de expressar em algo uma emoção ou ideia. Sendo assim, o sexo em si é uma expressão de arte legítima. Julgar-se-á a pornografia como algo que não transmite nada àquele que a absorve? Não. Ela transmite prazeres e desejos. Ela explora, através do sexo, a mente daquele que a percebe.

Artistas como Mihály Zicky, Milo Manara, Lawrence Donald Clark e demais outros são representações de pessoas que buscam explorar o sexo e o corpo humano como uma forma de expressão artística. Onde se busca não somente mostrar a naturalidade da sexualidade, mas também explorar as excentricidades do ato sexual.

A "vulgaridade" vista na pornografia é muito mais o reflexo do conservadorismo ainda presente na sociedade a respeito desse assunto do que propriamente com o ato sexual em si. Pornografia: arte ou vulgaridade? Particularmente, a considero como uma arte vulgar.
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Pornografia no cinema: a introdução do filme Deep Throat (Garganta Profunda) no mainstream, em 1972, provavelmente é o principal marco para a existência da indústria pornográfica mundial (esta que é uma das indústrias mais lucrativas do mundo). 

Desde o ingresso de Deep Throat, muitas das amarras que cerceiam a liberdade sexual foram rompidas. Porém, nem tudo são flores. Os realizadores do filme foram execrados por boa parte da população dos EUA e pelo então vigente governo Nixon, altamente "moralista" e defensor dos "valores familiares".

Ainda hoje pode-se encontrar em vários lugares pessoas que tratem alguém envolvido nesse tipo de atividade como uma pessoa devassa. A fala "toda atriz pornô é puta" ainda é muito disseminada pela sociedade. Os consumidores desse tipo de material são vistos como pervertidos. Essa luta incessante para cercear a liberdade sexual continua. 

Até quando seremos vítimas dos "valores familiares"?  Dos ditos "bons costumes"?

quinta-feira, 30 de abril de 2015

Transgressividade #6: Salò, ou os 120 Dias de Sodoma (1975)

Capa de Salò, ou os 120 Dias de Sodoma
"Um dos filmes mais notórios, poderosos e desafiadores da história!"
- DVD TIMES

"Um dos 100 melhores filmes do século XX"
- VILLAGE VOICE, PESQUISA DE CRÍTICOS DE CINEMA

"Um dos 100 filmes mais assustadores da história"
- CHICAGO FILM CRITICS ASSOCIATION

"A despedida impressionante e terrível de Pasolini"
- VILLAGE VOICE

Considerado um filme depravado, degradante, desumano, chocante, repulsivo e demais adjetivos desse gênero: esse é o último filme do renomado cineasta italiano Pier Paolo Pasolini.

Salò é uma adaptação livre e inconteste do romance 120 Dias de Sodoma do autor libertino e aristocrata francês Marquês de Sade. O enredo se passa na Itália - até então comandada por Benito Mussolini - no ano de 1944. Quatro dirigentes fascistas selecionam 16 jovens para satisfazer seus prazeres, obrigando-os a acatar qualquer ordem que lhes for dada.

Embora muitos possam não perceber isso - devido as cenas escatológicas e bizarras contidas no filme - com Salò, Pasolini faz uma crítica velada ao regime nazi-fascista que imperou na Itália na década de 40. A própria figura dos quatro dirigentes fascistas (um banqueiro, representando o poder econômico; um bispo, representando a Igreja; um duque, representando a nobreza; e um juiz, representando a ordem) são pontos em que Pasolini procurou evidenciar a putrefação de setores de uma sociedade em decadência em função do governo.

Após apresentar aos 16 jovens as regras que estes deveriam obedecer, a atmosfera bestial e inescrupulosa começa a tomar forma. No primeiro segmento do filme (que contém três segmentos) denominado Círculo das Obsessões, uma mulher assume a função de contar histórias eróticas para instigar a imaginação dos dirigentes que - quando se sente com vontade - escolhe um dos jovens e o leva para um aposento onde lhe é saciado os seus desejos.

No segundo segmento do filme, denominado Círculo da Merda, as histórias contadas (dessa vez por outra mulher) tem uma característica em especial: fezes. Tudo nesse segmento funciona em função de excremento. Cenas bizarras (e degradantes) são vistas, desde a competição para saber quem tem o ânus mais bonito até o grande banquete de merda que é servido para todos.

Cena onde os quatro homens conferem cautelosamente o ânus mais bonito,
cobrindo a cabeça dos jovens para que seu julgamento não seja influenciado.
No terceiro e último segmento, denominado Círculo do Sangue, os quatro homens punem àqueles que descumpriram as regras impostas no início. Em uma sucessão de cenas de tortura que vão desde usar fogo para queimar o pênis de um rapaz até usar marcadores de boi nos mamilos de uma moça, Pasolini confirma o que se viu durante toda a película: a degradação humana.

Salò, porém, vai além das cenas impactantes e perturbadoras. Com um roteiro fascinante, o diretor italiano consegue transmitir ao espectador uma repulsa imensa que beira ao inconcebível. A angústia de ver diálogos crus e viscerais é inquietante. A cada cena o espectador nutre e alimenta um asco que demora a ir embora.

Salò é talvez uma das obras mais impactantes da história. Faz jus a figura excêntrica que Pasolini construiu no decorrer de sua existência e de sua obra, que tinha em suas mais constantes características: a visão negativa do mundo e o abuso de cenas de nu-não-tão-artístico. Esta obra é, em definitivo, a despedida excruciante e inconteste de Pasolini.

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Curiosidades:

1. Salò é a primeira parte de uma trilogia que Pasolini pretendia produzir chamada Trilogia da Morte, porém a gravação desta não foi possível devido a morte do diretor poucos dias antes da estréia de Salò.
2. Ennio Morricone, compositor da trilha-sonora de Salò, diz ter se sentido desconfortável ao assistir o filme.
3. Apesar das grotescas cenas do filme, a atriz Hélène Surgère afirmou em entrevista que as gravações no set eram alegres e descontraídas.
4. O elenco não tinha muita noção de como o filme ficaria até que estivesse pronto devido ao exaustivo trabalho de edição que foi feito em cima de Salò.

segunda-feira, 13 de abril de 2015

Dedo de Prosa #1: Velozes e Furiosos 7

Capa de Velozes e Furiosos 7
A franquia de Dominic Toretto chega a sua sétima sequência, e mais uma vez, as cenas de ação são de arrepiar. Contando com a participação de Jason Statham, Kurt Russell, Djimon Hounsou, Nathalie Emmanuel e uma rápida aparição da rapper australiana Iggy Azalea, a turma de Toretto parte para mais uma de suas aventuras.

Apesar de ser o fulcro central do enredo, a vingança de Ian Shaw não é - em absoluto - o aspecto que dita a história em si. Muitos aspectos de importância compõem o enredo.

O dilema de Brian, tendo que viver uma vida pacata para dar o suporte necessário a sua mulher e filho e, ao mesmo tempo, conviver com a abstinência da adrenalina, a "saudade das balas". A confusão mental de Letty, que não consegue reviver em sua memória os momentos vividos ao lado de Dom. A própria homenagem realizada pelos atores à Paul Walker também ajuda a compor o enredo. Mas tudo mesclando velocidade e ferocidade.

Contudo, certas características do enredo não mudam. A frequente e cômica sacanagem que Roman e Tej fazem um com o outro, os constantes "sermões" de Dom sobre a importância da família, as cenas de ação cada vez mais absurdas e muito mais.

Porém, um dos trabalhos mais importantes dessa sétima sequência não está na frente das câmeras, ele está na direção. James Wan (Jogos Mortais, Invocação do Mal, Sobrenatural) trouxe um profissionalismo à franquia que ainda não havia se visto nos filmes anteriores. Enquadramentos fantásticos, acréscimo do foco no drama e um roteiro que, embora não seja lá grande coisa, consegue ser mais direto e efetivo do que o dos filmes anteriores.

A trama inicia com Ian Shaw no hospital, deixando seu irmão aos cuidados dos médicos. Logo após isso, ele vai atrás dos responsáveis da surra sofrida pelo irmão. Primeiro, ele pega Hobbs, deixando-o impossibilitado. Depois, ele vai atrás de Toretto e sua trupe. 

Para contra-atacar Shaw, Toretto se une a "Sr. Ninguém" (Kurt Russell), substituo de Hobbs na CIA. Porém, para firmar essa união, "Sr. Ninguém" precisa que Toretto resgate Ramsey (Nathalie Emmanuel), hacker responsável pela criação do "Olho de Deus", dispositivo capaz de encontrar qualquer pessoa em poucos instantes. Esse dispositivo está nas mãos erradas e "Sr. Ninguém" precisa tirá-lo deles.

Daí em diante, o que se vê é uma constante luta entre Ian Shaw x Toretto e cia. x raptores do Olho de Deus. As cenas são insanas, violentas: aquilo que um verdadeiro filme de ação necessita. Mas, apesar de toda atmosfera violenta, o filme tem uma alta carga melodramática, e não podia ser diferente. 

A repentina morte de Paul Walker durante as filmagens foi um dos fatores primordiais para todo o sucesso de Furious 7, que em 12 dias já se tornou o mais rentável da franquia. Os fãs da franquia compareceram em peso, para prestar essa última homenagem.

Durante todo o filme, a morte de Brian parece que está prestes a acontecer em diversas vezes. Fica aquela sensação de "é agora" dos espectadores. Em cada gesto, cada frase, pode-se perceber o momento chegando. Mas até então, ele não morre. Apenas no final do filme, quando Toretto e Brian se encontram na estrada e seguem em caminhos diferentes, é que a seguinte fala é vista, enquanto imagens dos filmes anteriores aparecem: 

"Eu costumava dizer que vivia só o momento e acho que por isso éramos irmãos, porque você também era assim. Não importa onde você esteja, se a um quilômetro de distância, ou do outro lado do mundo, você sempre estará comigo. E sempre será meu irmão".

Pode parecer uma homenagem piegas, mas a conjuntura do filme faz com que Furious 7 se torne um lindo filme-tributo à Paul Walker. E o que se pode concluir sobre o filme é: Velozes e Furiosos 7 passa longe de ser um filme artístico, mas é uma dose fascinante para quem busca entreter-se com boas cenas de ação e para quem deseja prestar uma última homenagem a esse personagem tão importante na franquia.

quinta-feira, 9 de abril de 2015

Trailer: A Centopeia Humana 3 - Sequência Final

Hoje, dia 9 de abril, a IBC Films divulgou (finalmente) o trailer do último filme da trilogia A Centopeia Humana. Para os conhecedores dos filmes anteriores, fica a ansiedade para a estreia, prevista para o dia 22 de maio nos EUA. Para os desconhecedores da franquia, o trailer já é um grande preparo para o que vem pela frente.

Trailer: Centopeia Humana 3 - Sequência Final

A trama conta com o retorno dos protagonistas dos filmes anteriores (Dieter Laser e Laurence R. Harvey), porém em papéis diferentes. Dieter interpreta Bill Doss, diretor de um completo carcerário - cansado dos problemas na penitenciária - que, ao lado de seu comparsa Dwight (interpretado por Harvey), resolve colocar em prática uma experiência vista em um filme. Para isso, ele contrata uma equipe médica para realizar um ato inimaginável: uma centopeia de quinhentas pessoas conectadas.

Para abrilhantar o filme, o elenco ainda conta com Eric Roberts, Robert LaSardo e a (maravilhosa) atriz pornô Bree Olson. E ainda há uma ponta de Tom Six, diretor e roteirista da franquia.

Agora é esperar e nos preparar para a próxima barbárie saída da mente insana do Tom Six.

domingo, 5 de abril de 2015

Transgressividade #5: Vase de Noces (1974)

Capa de Vase de Noces
Dirigido por Thierry Zéno, esse peculiar filme belga trata de um tema pouco abordado no mundo do cinema: a zoofilia. Mas não é apenas isso que o filme tenciona passar. Por trás de toda atmosfera bestial, há uma mensagem escondida.

Contendo uma belíssima trilha-sonora e com ausência de diálogos, Vase de Noces acaba por ser um filme muito interpretativo. O personagem interpretado por Dominique Gamy também não ajuda. Cabe ao telespectador estar atento aos acontecimentos da tela.

No início do filme, o personagem de Dominique Gamy aparece com um pássaro na mão, tentando colocar na cabeça da ave uma cabeça de boneca. Com a tentativa falha, ele liberta o pássaro.

O enredo inteiro gira em torno do relacionamento do homem com a porca. Mas o interessante no filme é a forma como a situação vem se formando. 

No convívio social humano, os relacionamentos são compostos por todo um processo de conhecimento e reciprocidade. Isso também é perceptível na forma como o homem trata a porca. Apesar de em algumas cenas ele aparecer nu por detrás da porca, em nenhum momento ele aplica o ato da penetração. Ele espera, pacientemente, até que a porca esteja preparada para isso. Pode ser uma analogia longínqua, mas não se pode dizer que esta seja errônea.

Cena do coito entre o homem e a porca.
Um misto de romance e prazer.
Até que o momento chega. Em um belo dia, os dois praticam o tão desejado (pelo homem) coito. A cena não é tão chocante quanto se pode imaginar. O carinho com que o homem trata o suíno torna toda a atmosfera presente na cena, de certa forma, até romântica. Após o coito, os descendentes nascem e a prole do curioso casal é formada.

Não julgarei a procedência de tal ato, pois não tenho conhecimento suficiente de medicina veterinária para afirmar se existe realmente a possibilidade de descendência em uma relação entre humanos e suínos. 

Deixo aqui apenas uma observação: em um dos episódios do seriado House, o médico diagnóstico Gregory House usa um suíno para drenar o sangue do seu paciente (e essa prática é realmente factível). Se o tipo sanguíneo de ambas espécies tem tamanha proximidade, não seria, ao menos provável, a fusão dos genes?

Mas... voltando ao filme. A partir do nascimento dos filhotes de híbridos, o homem passa a tentar "educá-los", tenta dar a eles uma natureza mais humana. Isso se torna notório na cena em que o homem coloca os três filhotes em cima da mesa, cada um em frente a uma tigela com leite. Porém, o que ocorre é que os três sempre tentam tomar o leite da mesma tigela (remetendo à mãe, fonte de onde os três conseguem se alimentar).

Sem conseguir obter sucesso nesse processo de educação, o homem enforca os filhotes e os coloca em três potes de vidro. Pouco mais a frente, a mãe se depara com a imagem de seus filhotes mortos e se suicida. Essa cena é bastante tocante, o desespero da mãe porca quando se depara com seus descendentes mortos é agoniante.  O grunhido/ronco dela é aterrador.

Quando a porca morre, o homem decide enterrá-la. Ele abre um buraco no chão e se deita ao lado da porca e começa a arrastar a terra para cobri-los. Porém, passado-se um tempo após estarem cobertos de terra, o homem se ergue e sai dali. Ele corre, nu, em direção a sua casa. Lá, ele vai de encontro aos seus filhotes mortos, como a expressar seu arrependimento.

O homem, aparentemente arrependido de ter matado os filhotes.
Logo após isso, ele pega o recipiente onde fazia suas necessidades fisiológicas e começa a degustá-las. Numa estratégia curiosa, ele ferve as fezes. Até mesmo as molha na sua urina, como se estivesse molhando-as em algum tipo de molho. Logo após essa sucessão de acontecimentos, ele se suicida. Sobe em uma escada e se enforca. E aqui o filme termina.

Vase de Noces é um filme de romance de gosto peculiar. Para os admiradores da cena underground, é uma ótima pedida. Gravado em preto e branco, com apenas um ator e uma mente singular por trás da realização, esse filme deixa marcado o seu nome na cena underground.

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Curiosidades:

1. O conceito do filme foi moldado a partir do quadro Pornocrates, de Félicien Rops. Pintor, litógrafo, gravurista e desenhista belga que abordava temas como sexo, morte e satanismo.
2. Há um acontecimento no filme de pouca relevância no enredo, mas curioso pelo fato de não ter um significado. Diariamente, o homem toca um sino. Mas não fica claro o porquê disso.
3. Vase de Noces é conhecido por vários nomes, inclusive The Pig Fucking Movie, que acabou por se tornar um subtítulo oficial em inglês do filme. Entretanto, o filme também é conhecido por Wedding Through (título oficial em inglês) e One Man and His Pig (título não-oficial).
4. A tradução do título original - Vase de Noces - para o português, significa "Vaso de Casamento", enquanto o título em inglês se traduz como "Através do Casamento".